sábado, 21 de julho de 2012

Sobre percepção, realidade, fantasia e lucidez.


A madrugada, para aqueles que insistem em vivenciá-la acordados, está sempre a nos enviar o infalível sinal para o registro de pensamentos existenciais. Pois bem, hoje eu sucumbi ao convite e quero apenas celebrar o meu absoluto estado de profunda contemplação das mudanças trazidas pela simples passagem de cada minuto da minha vida. 

Na contramão das histórias de heróis e vilões que tanto nos acostumamos a venerar nas mais variadas formas de arte, agrada-me proclamar que a vida não deve ser medida pelos acontecimentos "grandiosos" que todos anseiam eternizar. Afirmo que encontro mais prazer em celebrar o comum a eternizar os extremos; experimentar o calor de corriqueiras sensações a registrar a frieza dos fatos mais intrigantes; expressar vívidas emoções a externar o mais lógico dos pensamentos.

Não desejo ser associado a pedaços negros e brancos a codificarem um histórico de realizações, fracassos e sucessos. Perdoe-me, eu de outrora, mas considero o ser mais nobre que o fazer. Se o fazer eterniza as imagens nebulosas do primeiro beijo, da formatura, do primeiro emprego ou do dia do casamento; o ser celebra a certeza da inigualavelmente bela arte de tentar, experimentar, cair, vivenciar, sofrer, perder, sentir, reavaliar, se adaptar e, finalmente, vencer. Pois para cada começo e fim, há infindáveis recomeços e, principalmente, um meio tão glorioso e digno de ser ansiado quanto os extremos mais acessíveis e óbvios dos intervalos de tempo aos quais nos submetemos.  


O aqui e o agora, tão sublimes, tão grandiosos e dignificantes, regem a minha passagem por esse tempo: o amendoim torrado que saboreei; o frio que me enrijeceu os dedos do pé quando saí à noite de sandálias ao supermercado; a antiga canção que redescobri graças ao vasto acervo de glórias de esquecidos artistas no Youtube; a empolgação que me tomou ao ver evidências a favor da minha vil crença de ser capaz de trazer felicidade às pessoas que eu escolhi amar; e a certeza contagiante de que o amanhã trará um novo meio, repleto de detalhes banais que me farão novamente fantasiar o significado do que é estarem unidas percepção e realidade, até que a morte as separem, ou até que eu seja apresentado ao meu novo eu e torne, ainda em vida, a separá-las num sopro de fugaz lucidez.


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